sábado, outubro 15, 2005

Crónica de mais um dia de luta pela Justiça!


Perto das cinco da manhã já se perfilavam no ponto de encontro junto ao aeroporto dezenas de pilotos, equipas de televisão e amigos do Nini, prontos a embarcar no autocarro que nos levaria a Salamanca. Era o dia do início da Cimeira Ibero-Americana e propício à sensibilização de Hugo Chávez para o problema da prolongada detenção, sem julgamento, de um inocente apanhado nas malhas de uma teia feita de contornos e cumplicidades estranhas.
Feita uma paragem na Guarda, tomou-se o matabicho e ocultaram-se os cartazes cuja visibilidade podia comprometer a passagem na fronteira.
Por volta das 11, hora espanhola, chegávamos ao destino, sem sobressaltos. Desde logo observámos o aparato de segurança. Helicópteros, a presença da polícia por todo o lado, a pé ou automobilizada que nos controlava sem disfarce mas sempre de forma correcta e tolerante.
Conseguimos chegar a um ponto a cerca de 200 ou 300 metros do local onde iria ter lugar a Cimeira e de passagem de inúmeros peões. A polícia autorizou-nos a fixação no local durante cerca de meia hora que foi aproveitada para que as televisões divulgassem as imagens e fossem feitas entrevistas. Os pilotos, aprumados nas suas belas fardas, colocados ao lado do grande cartaz, enquanto nós entregávamos aos passantes cópias A4 do mesmo, em inglês e castelhano. Algumas palavras de admiração e louvor, tenho de dizer, pela atitude manifestada pelo povo espanhol, de interesse e compreensão pelo problema, bem diversa da que senti em Lisboa onde alguma indiferença e incompreensão foram evidenciadas por algumas pessoas. Foi-me dito por cá: se está preso é porque é culpado! Ponto final. É triste verificar o julgamento sumário de quem se está nas tintas para o sofrimento alheio e nem procura explicações para os acontecimentos. Infelizmente todos constatamos o carácter individualista e mesquinho do povo luso como já era afirmado por Basílio Teles, Eça ou Ortigão no século XIX. Não mudámos muito!
Os espanhóis com familiares na Venezuela, ou outros que lá haviam vivido, garantiram-nos saber bem qual a realidade daquele país, lamentando o sucedido ao Nini e mostrando preocupação quanto à forma de condução do processo. Confirmaram-nos apenas o que já sabíamos bem. É reconfortante, contudo, a solidariedade.
O boato de que Chávez não havia chegado corria célere, quiçá numa tentativa de desmobilização, mas finalmente foi confirmada a sua presença. A polícia mandou-nos, entretanto, dispersar e dirigimo-nos à Plazza Mayor onde circulavam muitas pessoas, depois de uma qualquer cerimónia pública que não identifiquei. Após alguns largos minutos a polícia falou com o representante dos pilotos, "sugerindo" que o tempo tinha acabado e que devíamos recolher, ou seja, dar por finda a manifestação e ir embora. Assim fizemos, pacificamente, escoltados até ao autocarro por policiais a pé e por um carro blindado. Os helicópteros brindavam-nos também com a sua sonora e visível presença, deambulando por sobre as nossas cabeças.
Eu e duas colegas avançávamos vagarosamente pela ponte enquanto sorvíamos a majestosa paisagem e eu lhes falava da história de Salamanca. Eis que as sirenes policiais se fizeram ouvir e assistimos à passagem a alta velocidade de diversos carros topo de gama, dentro dos quais seguia a comitiva de vários países sul-americanos: Brasil, Panamá, Venezuela... Pensámos ter vislumbrado o Chávez e agitámos freneticamente pequenos papéis enquanto mostrávamos as t-shirts com a foto do Nini e a palavra INOCENTE. Ao nosso lado, um homem atirava para a frente o peito, onde se podia ler: Morte ao Fidel. Mais ao fundo, a Bela e o Duarte agitavam a bandeira portuguesa.
Seguidos pela Polícia até ao limite da cidade, parámos num restaurante para almoçar e fazer o balanço do dia.
Positivo. Atingimos os objectivos. Tivemos visibilidade.
Foi mais um dia em que a solidariedade foi a palavra de ordem. Enterneci-me por ver e sentir o calor solidário dos pilotos, colegas de profissão, que não desarmam. Podia ter sido qualquer um de nós-diziam. Foi o Nini e por ele lutaremos até ao fim. Como nós, os amigos do Nini e da Júlia. Como gostaríamos que se fizesse por cada uma das pessoas injustiçadas no mundo e por nós próprios.
Dia 24 fará 1 ano que o Nini foi detido. Será mais um momento desta luta sem um previsto fim à vista. Para dia 27 está marcado o 21º julgamento que será o 1º..... (?????)
Um forte abraço ao Nini e a minha total solidariedade.

1 comentário:

Luisa Hingá disse...

Um abracinho.