Deu-me para fazer uma reflexão sobre um percurso pessoal de fascinação pelas letras e palavras escritas.
Aos 3 anos, o meu pai, perante a minha insistência, pacientemente, foi-me ensinando o alfabeto. Quando chegava ao E, contrariava-o: qual E, mas então não se está a ver que é um pente? No F, o meu pai tinha que se confrontar, inevitavelmente, com a ideia de que estava perante um pente partido. Não percebia, então, porque razão a minha aprendizagem era motivo de gargalhada de toda a família que ainda hoje solta risadas lembrando a minha peculiar veia artística.
Vieram depois as histórias de encantar, infinitamente contadas. Qualquer variação era terrivelmente censurada, embora as novas artimanhas do lobo mau fossem escutadas de forma ávida quando devidamente justificadas.
Os livros de pano, a colecção da Formiguinha e outras afins, assim que aprendi a ler, foram todos lidos e relidos. A livraria Salema na Beira e mais tarde a Clássica eram templos onde eu e a minha irmã passávamos horas esquecidas enquanto a mãe deambulava entre compras de roupas e víveres.
A chegada dos Cinco veio criar algumas contrariedades pois que os TPC eram remetidos para as calendas gregas e porque as noites passadas a ler dificultavam os dias de olhos abertos e a atenção nas aulas. Esta colecção foi lida e relida vezes sem conta, a ponto de quase ser decorada. Sabia-se perfeitamente em que livro entravam os bandidos x, y ou z. Os Sete não trouxeram tanta emoção, nem a nova versão Enid Blyton de capa dura. Quase em simultâneo, a colecção azul do "Pequeno Lorde" e outros, em que se integravam títulos da Condessa de Ségur, que não lembro bem, a colecção da "Heidi" e da "Cabana do Pai Tomás", com temas que despertavam outros tipos de emoções.
Oh, os Astérix... criaram um novo reboliço lá em casa, a ponto de eu e a minha irmã reduzirmos muitos dos nossos diálogos a citações dos livros como que criando uma espécie de código de entendimento.