segunda-feira, dezembro 26, 2005

BB



Ouvia hoje na Sic Notícias o Baptista Bastos e quero deixar registados dois interessantes comentários seus.
Um, sobre a passividade dos portugueses perante o imparável cortejo de escândalos nacionais, a qual, segundo ele e citando Anna Arendt, se prende com a "banalização do mal".
O outro, em que salientava com simpatia a onda de solidariedade que se levantou após o tsunami (que metáfora não propositada mais a propósito...) num mundo em que a palavra de ordem competitividade, inevitavelmente, tem imprimido mudanças no padrão de valores humanos.

sexta-feira, dezembro 23, 2005

Natal, tempo de amor?

Não posso deixar de manifestar o meu nojo face a actos inqualificáveis, como este.

SIC

Espanha em choque


Três adolescentes queimaram uma sem-abrigo que acabou por morrer.

Special night...





A todos os amigos que vão passando, de quando em quando, por esta minha modesta casinha, desejo que não apenas esta mas todas as noites do ano sejam.........
Pensando melhor, não todas as noites pois deixariam, então, de ser especiais.

domingo, dezembro 18, 2005

Letras I

Deu-me para fazer uma reflexão sobre um percurso pessoal de fascinação pelas letras e palavras escritas.
Aos 3 anos, o meu pai, perante a minha insistência, pacientemente, foi-me ensinando o alfabeto. Quando chegava ao E, contrariava-o: qual E, mas então não se está a ver que é um pente? No F, o meu pai tinha que se confrontar, inevitavelmente, com a ideia de que estava perante um pente partido. Não percebia, então, porque razão a minha aprendizagem era motivo de gargalhada de toda a família que ainda hoje solta risadas lembrando a minha peculiar veia artística.
Vieram depois as histórias de encantar, infinitamente contadas. Qualquer variação era terrivelmente censurada, embora as novas artimanhas do lobo mau fossem escutadas de forma ávida quando devidamente justificadas.
Os livros de pano, a colecção da Formiguinha e outras afins, assim que aprendi a ler, foram todos lidos e relidos. A livraria Salema na Beira e mais tarde a Clássica eram templos onde eu e a minha irmã passávamos horas esquecidas enquanto a mãe deambulava entre compras de roupas e víveres.
A chegada dos Cinco veio criar algumas contrariedades pois que os TPC eram remetidos para as calendas gregas e porque as noites passadas a ler dificultavam os dias de olhos abertos e a atenção nas aulas. Esta colecção foi lida e relida vezes sem conta, a ponto de quase ser decorada. Sabia-se perfeitamente em que livro entravam os bandidos x, y ou z. Os Sete não trouxeram tanta emoção, nem a nova versão Enid Blyton de capa dura. Quase em simultâneo, a colecção azul do "Pequeno Lorde" e outros, em que se integravam títulos da Condessa de Ségur, que não lembro bem, a colecção da "Heidi" e da "Cabana do Pai Tomás", com temas que despertavam outros tipos de emoções.
Oh, os Astérix... criaram um novo reboliço lá em casa, a ponto de eu e a minha irmã reduzirmos muitos dos nossos diálogos a citações dos livros como que criando uma espécie de código de entendimento.

quinta-feira, dezembro 15, 2005

Inocente!

Hoje na escola todos procuravam a Júlia. Fui a primeira a vê-la. Um abraço forte mas curto perante a saraivada de outros abraços e clamores de alegria de todos os que acorriam para repetir abraços até à sua exaustão. Ela estava muito serena como quem ainda caminha na estrada feita de obstáculos, incredulidades e injustiças que inevitavelmente a endureceu. O Bernardo atordoado ainda...
O Nini chegará decerto domingo. Dentro dele um sem número de desabafos e denúncias... que o Luís nunca teve papas na língua. É um resistente que sempre teve uma elevada auto-estima e uma boa dose de coragem. Não se intimida, não. Já lhe disse que espero a tradução em palavras escritas desta longa saga de que foi protagonista. Daria muita matéria para um óptimo enredo a um John Le Carré...
Louvores para a união dos pilotos que de forma persistente se lançaram na luta pela justiça, para a comunicação social que não deixou cair o assunto no esquecimento, à família e aos amigos. Também palavras de gratidão para todos aqueles que aqui no mundo virtual sempre acreditaram na sua inocência e se mantiveram solidários.

Um Bom Natal para esta família que, finalmente reunida, o vai saborear ainda mais calorosa e intensamente.

sexta-feira, dezembro 09, 2005

Natal - Jorge de Sena

Natal de 1971


Natal de quê? De quem?
Daqueles que o não têm?
Dos que não são cristãos?
Ou de quem traz às costas
As cinzas de milhões?
Natal de paz agora
Nesta terra de sangue?
Natal de liberdade
Num mundo de oprimidos?
Natal de uma justiça
Roubada sempre a todos?
Natal de ser-se igual
Em ser-se concebido,
Em de um ventre nascer-se,
Em por de amor sofrer-se,
Em de morte morrer-se,
E de ser-se esquecido?
Natal de caridade,
Quando a fome ainda mata?
Natal de qual esperança
Num mundo todo bombas?
Natal de honesta fé,
Com gente que é traição,
Vil ódio, mesquinhez,
E até Natal de amor?
Natal de quê? De quem?
Daqueles que o não têm?
Ou dos que olhando ao longe
Sonham de humana vida
Um mundo que não há?
Ou dos que se torturam
E torturados são
Na crença de que os homens
Devem estender-se a mão?

Jorge de Sena

Natal!!!!


A iluminação já aí está. O comércio fecha mais tarde. Por todo lado, pessoas que compram e compram e compram... Papéis coloridos e lacinhos. Isto é para a, aquele para b... Um fartote de presentes. Alguns úteis outros de uma inutilidade incrível. Só para cumprir a tradição. Que nem é, afinal. Antigamente, quando este frenesim de consumismo de bagatelas natalícias ainda não era moda, ofereciam-se aqueles presentes simbólicos como o gorro, as meias ou o cachecol executados artesanalmente ao longo do ano. Isso, nas terras nórdicas. E no sul? Bem, já sou do tempo do sapatinho, felizmente cheio de livros, muitos livros que desembrulhava ansiosa e deslumbrada. E aquela sombrinha chinesa... e as bonecas de papel que recortava e vestia imaginando histórias lindas... Era no dia 25 de manhã que acorríamos à cozinha para ver o que o Menino Jesus tinha deixado e não à meia noite como agora. Em minha casa ele não precisava de se apressar. De resto, não havia, também, nem presépio nem árvore de Natal pois que a simbologia da época não tinha lugar lá em casa. Uma coisa que me ficou, dado que até hoje nunca enfeitei a minha casa. Minto. Costumo colocar na mesa uma toalha com motivos natalícios que me deram há anos. Questão de utilidade.
As portas da vizinhança têm decorações diversas e pelas várias janelas já se solta o pirilampear das luzes da árvore de Natal. Uma coisa que me incomoda bastante é o último grito das modas de Natal. Vejo Pais Natal pendurados em janelas e varandas. Uns parece que vão a trepar mas outros dá ideia que acabaram de se enforcar. Eles lá sabem do estado do país... e do mundo.
Enfim... não morro de amores por esta euforia da quadra. É o desperdício de dinheiro, daqueles que podem, em brinquedos sofisticados que depois de alguns dias são postos de lado, num percurso "educativo" que acrescenta todos os dias a ideia do fácil: "eu quero...eu tenho". São as palavras de amor que então abundam, dando um pouco a ideia de que são dispensáveis nos outros dias do ano. Coisa semelhante ao dia Internacional disto e daquilo. Daí que muitas vezes me soam a hipocrisia. Mais ou menos como a amnistia de Bush relativamente aos perus do dia de Acção de Graças, quando a pena de morte é praticada sobre os humanos.

quinta-feira, dezembro 01, 2005

O fiel jardineiro


Ontem fui com a Mi ao cinema.
Já tinha lido o livro: John Le Carré no seu melhor. Ao longo das páginas não precisei de fazer nenhum esforço para que as imagens descritas desfilassem familiares pelos olhos da memória. Enquanto lemos compomos as imagens, obviamente, de acordo com uma realidade reconhecida.
No filme encontrei variações, tendo em conta os grupos étnicos presentes, diversos dos que a minha memória registou através da leitura do livro. Contudo, as paisagens, a vida nas cidades africanas, essas, foram imagens que acorreram de forma mais fidedigna.
Os aviões, que distribuem mantimentos em savanas de fome, idênticos aos que via levantar todos os dias do aeroporto de Luanda, rumo ao um qualquer ponto onde a ajuda humanitária é precisa.

A essência da obra: um laboratório em África, cobaias humanas sob o peso da miséria e das alianças corruptas entre transnacionais farmacêuticas e os poderes nacionais.

Mesmo assim, as cenas finais das crianças que ainda soltam risadas e intentam deixar entretecido com a revolta um muito fino fio de optimismo...

Gostei também da homenagem feita à mulher africana: "ela faz a casa e o homem a guerra" e "Deus criou primeiro o homem mas aperfeiçoou-se à segunda tentativa quando criou a mulher".

PS- A vantagem do livro sobre o filme é que o livro é apreciado e digerido mais lentamente, e exercita mais intensamente a capacidade imaginativa.